A safra precisa acontecer, para não emagrecer o país

Por Coriolano Xavier, membro do Conselho Científico Agro Sustentável (CCAS) e professor do Núcleo de Estudos do Agronegócio da ESPM

A safra precisa acontecer, para não emagrecer o país
Foto: Wanderson Araújo/Trilux/EBC

O debate está no ar: o dinheiro para crédito rural já apertou e o governo está sem recursos para o Plano Safra 2022-2023, que começa a contar no segundo semestre. No momento, a perspectiva do crédito rural para a próxima safra é de desequilíbrio entre o necessário e o disponível no orçamento projetado, diante da nova realidade dos juros, que saltaram de 2,5% em meados do ano passado para 11,75% agora. Com essa escalada, o dinheiro previsto para o crédito rural neste ano já foi gasto no primeiro semestre, esvaziando o cofre.

Como a expectativa é de um volume de R$ 9 bilhões para cobrir os juros do Plano Safra 2022-2023, esse dinheiro precisa ser remanejado de outros espaços do orçamento federal, já que a regra do teto de gastos limita a alocação recursos extraordinários. Nos bastidores do governo e do mercado, também circularam balões de ensaio sobre a hipótese de novos termos de financiamento com um aumento da taxa de juros do crédito rural, como alternativa para acomodar a situação. 

Nosso país pratica um dos menores níveis de apoio à agricultura do mundo, segundo dados da Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), que mede a proporção da receita bruta da agricultura que vem do apoio das Políticas Agrícolas de governos. É a chamada Estimativa de Apoio ao Produtor (PSE na sigla em inglês). Esse levantamento indica que a PSE do Brasil foi de 1,35% em 2020 (último dado disponível), frente a 18,07% na média dos países membros da OCDE (as economias mais avançadas do mundo). Com um particular: para Estados Unidos e China, os dois maiores produtores agrícolas, os índices PSE foram 11,03% e 12,17%, respectivamente.

Sob essa perspectiva, a política agrícola brasileira é eficiente e tem um baixo custo para o governo. Por exemplo: se tomarmos por base os gastos com essa política em 2021, observa-se que corresponderam a somente 0,84% do Valor Bruto de Produção Agropecuária (VBP), que foi de R$ 1,13 trilhão. Ou seja, um custo total para o governo de R$ 9,5 bilhões, montante equivalente a pouco mais de 15% do que foi pago em precatórios (R$ 54 bilhões) em 2021.

A política agrícola brasileira, enfim, é barata e bastante assertiva, pelos benefícios que a agropecuária traz para a sociedade. Por exemplo, a garantia de segurança alimentar, evolução do IDH nas regiões produtoras, liderança na exportação de vários alimentos e elevado saldo na balança comercial agrícola. Além disso, ainda vivemos hoje impactos profundos da pandemia, agora potencializados pela guerra na Ucrânia e pelos problemas climáticos. E o resultado são fatores que invadem nosso cotidiano, como alta no preço das commodities, desorganização de cadeias produtivas, inflação dos alimentos e alta dos juros, entre outros reflexos.

Um contexto no qual é essencial assegurar a expansão da produção agrícola, viabilizando o crédito suficiente para a safra. Como forma de criar um contraponto à inflação dos alimentos, reforçar a estabilidade de nossa segurança alimentar interna e ampliar o protagonismo do país no mercado internacional. Este último ponto, aliás, é questão de marketing estratégico para o país, pois os órgãos internacionais já reconhecem que o Brasil representa hoje a garantia de segurança alimentar do mundo. Ocupar mais rápido esse espaço, aproveitando a janela de oportunidade, é fortalecer nossas raízes de competitividade e trazer o futuro para mais perto.