Cadê as abelhas que estavam aqui?

Por Decio Luiz Gazzoni, engenheiro agrônomo, pesquisador da Embrapa Soja e membro do Conselho Científico Agro Sustentável

Cadê as abelhas que estavam aqui?
Foto: Alberto Marsaro Júnior/Embrapa

Duas perguntas que intrigam a sociedade, alarmada como notícias como as relacionadas à Distúrbio do Colapso das Colonias (DCC, ou CCD, na sigla em inglês): Por que as abelhas estão desaparecendo? Como resolver o problema?

O assunto chamou tanta atenção, que a revista Time dedicou uma matéria de capa ao fenômeno, instigando com a manchete “Um mundo sem abelhas” (http://bitly.ws/smuV). O desaparecimento cíclico das abelhas é um enigma que persiste há 200 anos. Os cientistas continuarão a estudá-lo até elucidar o fato. De posse da resposta, será fácil encaminhar as soluções.

Até o momento, o que sabemos é que um conjunto de causas como perda de habitat, estresse de movimentação, distúrbios nutricionais, pragas e doenças das abelhas e produtos usados para o seu controle, assim como agrotóxicos usados indevidamente, são suspeitos de, atuando cumulativamente, serem responsáveis pelo desaparecimento das abelhas.

O fenômeno parece restrito ao Hemisfério Norte, principalmente localizado nos Estados Unidos, onde costuma ocorrer em intervalos variáveis, durando 2-3 anos, tornando a aparecer décadas depois. Não existe registro do fenômeno no Brasil.

Morte de abelhas

Mesmo em casos de mortalidade de abelhas não associadas ao DCC, as soluções não são fáceis. Exemplo: as colônias de abelhas da espécie Apis mellifera são atacadas por um ácaro devastador (Varroa destructor). Mas, os acaricidas que controlam o ácaro, também são perniciosos para as abelhas. Até surgir um acaricida seguro para as abelhas, será necessário usá-los, ou o ácaro as extermina.

A mera proibição de agrotóxicos não parece uma boa ideia. Pode até parecer que resolve o problema, mas pode criar outros, por vezes mais sérios. Proibir inseticidas neonicotinoides, como ocorreu na Europa, levou os agricultores a usarem pesticidas mais antigos, mais tóxicos para as abelhas e outros animais, incluindo o Homem. A emenda revelou-se pior que o soneto!

Existem diversas causas para a morte de abelhas, o mau uso de pesticidas é uma delas. Há questões sanitárias (pragas que atacam as abelhas), base genética estreita, mudanças climáticas, entre outras. Em nossa opinião, se há uma política pública que pode auxiliar a resolver o problema, esta seria a de proteger o habitat nativo das abelhas. Por conta da expansão das cidades, da infraestrutura, de rodovias e da agricultura, as abelhas estão perdendo o seu habitat nativo.

Recuperar essas áreas será fundamental, em especial com o uso de plantas que favoreçam os polinizadores. Nesse particular, a Embrapa está finalizando a publicação de um livro denominado “Plantas que os polinizadores gostam”, que estará disponível para o público em geral até dezembro de 2022.

O tema é complicado para cientistas e ainda mais para leigos. Recomendo desconfiar de novas informações, a menos que sejam de uma fonte lastreada em boa Ciência. Não confunda um blog adepto da teoria da conspiração ou contra o desenvolvimento tecnológico com dados científicos reais.

Também desconfie de um artigo científico isolado. Em Ciência só a repetitividade convence. A Ciência evolui: nosso conhecimento de abelhas mudou radicalmente em 10 anos. Muitas teorias foram descartadas conforme novas evidências surgiram. Mesmo tudo o que eu já escrevi pode mudar porque, para um cientista, a verdade é a última verdade comprovada. Os episódios de DCC não foram elucidados, mas não deverá desembocar em um grand finale ou um clímax. Muito provavelmente, descobriremos que se trata de um fenômeno multifatorial, complexo e cheio de personagens entrelaçados. De sua elucidação dependerá o encaminhamento dos estudos para sua solução.