Telefones celulares prejudicam as abelhas?

Por Decio Luiz Gazzoni, engenheiro agrônomo, pesquisador da Embrapa Soja e membro do Conselho Científico Agro Sustentável - CCAS

Telefones celulares prejudicam as abelhas?
Foto: Divulgação CCAS

Sabe-se que alguns fatores, como a perda de habitat ou o uso errado de pesticidas podem ser fatal para espécies de insetos úteis, como as abelhas. Há outros fatores, o que inclui a radiação de telefones celulares, que podem ter contribuído para o declínio dramático nas populações de insetos observado na Europa, nos últimos anos. É o que mostra um estudo realizado pela Nature and Biodiversity Conservation Union (NABU) da Alemanha em conjunto com duas ONGs, uma da Alemanha e uma de Luxemburgo.

Trata-se de uma metanálise de 190 estudos científicos recentes. Desses, 83 foram considerados cientificamente relevantes e, entre eles, 72 mostraram que a radiação teve um efeito negativo sobre as abelhas, vespas e moscas. Esses efeitos variaram desde uma capacidade reduzida de orientação durante o voo - devido à perturbação dos campos magnéticos - até danos ao material genético e às larvas.

Os estudos mostram que a radiação do celular e, em especial, do espectro magnético abrangido pelas redes de wifi, abre os canais de cálcio na membrana de certas células. Com os canais abertos, as células absorvem mais íons de cálcio. O excesso de cálcio pode desencadear uma reação bioquímica em cadeia nos insetos, interrompendo os ritmos circadianos e o sistema imunológico.

Modernidade, ambiente e alimentos

É uma típica verdade inconveniente para os usuários, pois o telefone celular é parte da vida de praticamente todos os cidadãos do mundo. Além disso, há interesses econômicos e empresariais na tecnologia de comunicação móvel. A vida moderna, em seus múltiplos aspectos, é cada vez mais dependente dos celulares, da internet e das conexões de wifi.

Em contraste, são poucos os cidadãos que possuem uma ideia clara sobre a cadeia trófica alimentar ou sobre serviços ecossistêmicos. Os insetos constituem elos da cadeia alimentar. Trata-se de um sistema altamente complexo e, sempre que um dos elos da cadeia é rompido, ocorrem perturbações, com efeitos imprevisíveis. Nós, humanos, estamos situados no topo da cadeia, portanto, qualquer perturbação ou disrompimento ao longo da cadeia, afeta diretamente a espécie humana.

Não menos complexos são os serviços ecossistêmicos, aqueles providos gratuitamente pela Natureza. Sem eles, a vida na Terra ou não existiria, ou seria muito diferente do que é. Se forem afetados serviços como polinização ou controle biológico de pragas, prestados por insetos, a oferta de alimentos e outros produtos agrícolas pode ser profundamente comprometida.

Atenção maior deve ser dada às novas redes 5G, com velocidade até 100 vezes mais rápidas do que as atuais redes 4G. Avanço tecnológico é fundamental para a qualidade de vida no planeta Terra. Mas, a chave do sucesso está em atentar para a sua sustentabilidade, o seu custo benefício, cotejar os impactos negativos frente aos ganhos que uma tecnologia oferece.

A União Europeia está muito preocupada com os efeitos de novas tecnologias sobre a biodiversidade (bitly.ws/vvPY). Para o cumprimento das metas, serão necessários investimentos em estudos dos impactos sobre a cadeia alimentar e os serviços ecossistêmicos, e como mitigar os efeitos negativos. Não apenas na Europa, mas ao redor do único planeta de que dispomos, a Terra.