A América Latina perde seu gigante gentil: Miguel Carballal, o pioneiro do Plantio Direto no Uruguai
Por Marie Bartz
A coluna desta edição é dedicada à memória de nosso gigante gentil: o honorável Miguel Carballal, pioneiro do plantio direto no Uruguai, da região de Mercedes, Soriano. Miguel Carballal nasceu em Montevidéu em oito de outubro de 1941 e nos deixou no dia 26 de novembro de 2022, em Mercedes. Escrevemos a coluna a seis mãos: eu, com auxílio de Rafael Fuentes Llanillo (IDR-Paraná) e de Ivo Mello (Irga). Contaremos um pouco sobre a trajetória desse homem, que teve papel fundamental não só na implantação do sistema plantio direto naquele país, como também na formação e estruturação da Confederação das Associações Americanas para uma Agricultura Sustentável (CAAPAS).
Miguel era um homem de grande estatura e corpulento. À primeira vista, para quem não o conhecia, ele parecia intimidador. Mas quem vê cara, não vê coração, diz o ditado, não? Miguel era conhecido entre os integrantes da família plantio direto por sua extrema humildade, sincera amabilidade e gentileza sem fim. Quando o plantio direto era apenas uma conjectura no Uruguai, no início dos anos 1980, Miguel Carballal - acompanhado de Raul Martinez, Gelio Mazzilli e Enrique Marchesi, seus companheiros de jornada - começou a estudar tudo o que acontecia no Brasil e na Argentina para poder adaptar ao sistema predominantemente pecuário do Uruguai.
Além de adotar o plantio direto em suas próprias terras e, já de cara, fazer integração lavoura-pecuária, com toda aquela humildade e amabilidade carismáticas, envolveu na caminhada o organismo nacional de pesquisas INIA e a Universidad de la República Udelar.
Em 1991, foi fundador da Ausid, a Asociación Uruguaya Pro Siembra Direta, da qual foi presidente por diversas vezes e na qual se manteve como colaborador até o dia de sua morte. A Ausid tinha sua marca na missão: “Fomentar e estimular a pesquisa, aplicação e divulgação do plantio direto para um melhor manejo do solo, aproveitamento da água e, assim, garantir a sustentabilidade do planeta”.
Em 1992, foi personagem ativo da criação da CAAPAS, entidade de que foi presidente por dois mandatos, o último até 2019. Manteve-se colaborando como secretário de todas as assembleias, sendo o guardião do livro de atas e da formalização jurídica da entidade nesses últimos tempos até a sua passagem.
Encontramos Miguel Carballal, pela última vez nesta dimensão, nos dias 18 e 19 de outubro deste ano na 23ª Jornada Anual da Ausid e no 1º Encuentro Nacional de Agricultura Sostenible na sua amada Mercedes, Soriano, Uruguai. Parecia um menino, com planos de curto, médio e longo prazo, como que sabendo que tinha feito sua parte e deixado um legado a ser continuado pelos demais.
Recebeu lá uma merecida homenagem como lendário presidente da CAAPAS e disse: “Nós, os produtores, deve- mos recriar muito o cenário, usar a imaginação e manejar novas alternativas. Os dinossauros do plantio direto, como eu, fizemos muito até agora, mas quem sabe isso não é nem a metade do caminho. Sempre se apresentam novos desafios para a humanidade”.
Vai, Miguel Carballal, fazer plantio direto lá no céu que é o seu lugar, junto aos nossos amados pioneiros que já lá estão! A América do Sul perde um de seus grandes líderes do sistema plantio direto e da agricultura sustentável, fundador e pilar da Ausid e da CAAPAS durante tantos anos. Que Deus console sua família e amigos. Fica o agradecimento à honra de ter convivido com esse homem que foi exemplo de vida em família, na atividade agrícola e como dirigente de organizações de produtores da agricultura sustentável. Seu legado permanece para todos nós!
Marie Bartz é bióloga, Centro de Agricultura Regenerativa e Biológica e Centro de Ecologia Funcional da Universidade de Coimbra, em Portugal, e Federação Brasileira do Sistema Plantio Direto - FEBRAPDP
Artigo originalmente publicado na Revista A Granja, edição 888 - Dezembro/2022