A conservação do solo como prática fundamental da agricultura

Por Afonso Peche Filho, pesquisador Científico do Instituto Agronômico de Campinas - IAC

A conservação do solo como prática fundamental da agricultura
Plantio de milho sobre cobertura morta - Foto: Claudio Lucas Capeche/Embrapa Milho e Sorgo

Introdução

De forma geral, toda atividade agrícola degrada, com maior ou menor intensidade. Partindo dessa premissa, podemos admitir uma diferença em conservar o solo e controlar a erosão.  Na agricultura moderna, a conservação do solo e da água pode ser definida como um conjunto de atividades protetoras e harmoniosas com a dinâmica do agroecossistema. Procura proteger e “ativar” as condições de vida no solo. As práticas de controle da erosão são atividades diferentes, utilizadas quando as áreas produtivas apresentam sinais de fragilização ou ocorrências erosivas e necessitam de intervenções como forma de tratamento preventivo ou recuperativo.  Portanto, as práticas de conservação do solo são as protetoras e as de controle da erosão são preventivas e recuperadoras. Às práticas revitalizadoras de “terras cansadas” dá-se o nome de agricultura regenerativa.

 

Importância das práticas conservacionistas

A conservação moderna do solo propõe um conjunto de métodos e práticas agrícolas para desenvolver e proteger a biocenose (comunidades biológicas e interações de espécies) e o biótopo (conjunto de condições físicas e químicas de abrigo) presentes no solo. São atividades voltadas para a preservação da vida, da estrutura e da resiliência do solo. O objetivo principal é buscar e manter o alto funcionamento dos solos tropicais, tendo por diretrizes cinco princípios básicos:

1 – Proteger a superfície do solo contra a radiação solar e as chuvas torrenciais;

2 – Prover condições ideais para desenvolvimento de comunidades biológicas;

3 – Manter e aumentar as funcionalidades hidrológicas;

4 – Eliminar a perda de carbono armazenado no solo;

5 – Desenvolver as habilidades conservacionistas dos agricultores,

As práticas conservacionistas são focadas na manutenção qualitativa das funções importantes do solo, como:

  • Apoio às plantas produtivas;
  • Manter a cadeia trófica ou alimentar (sequência linear da transferência de matéria e energia no agroecossistema, ou seja, a sequência de organismos servindo de alimento para outros);
  • Eficiência na ciclagem interna de nutrientes;
  • Manutenção da estabilidade de agregação e resistência à erosão;
  • Infiltração e drenagem rápida da água;
  • Filtragem e armazenamento da água;
  • Manter e aumentar a capacidade de biorremediação dos solos;
  • Manter e melhorar o efeito supressivo, ou seja, a capacidade do solo vivo em inibir patógenos, doenças e pragas;
  • Manter a capacidade de ajudar a planta a crescer e produzir durante eventos “estressantes”, ou seja, manter a resiliência alta de forma permanente.

 

Importância das práticas de controle da erosão

A erosão é um processo resultante, causado pela retirada da cobertura natural sem levar em consideração a vulnerabilidade do terreno.  Toda forma antrópica de ocupação e uso da terra produz externalidades erosivas com maior ou menor intensidade. É intensificada pela ocupação sem planejamento e por formas primitivas de usos do solo. Como ocupação, podemos elencar a posição na encosta, sentido de instalação, dimensões, áreas de locomoção, bem como todas as áreas construídas e áreas protegidas. Como uso, temos a forma preparo, o tipo de lavoura, formas de irrigação, controle do mato, pragas e doenças. O uso inadequado do solo produz a magnitude, ou seja, a grandeza ou importância do processo erosivo em diferentes tipologias. Toda prática voltada para o controle da erosão necessita de conhecimentos básicos do local, para ser executada com sucesso. É preciso conhecer o solo, topografia, características climáticas e o histórico de uso da área. A partir dessa avaliação é que se propõem as práticas de prevenção e controle da erosão. O objetivo principal é o tratamento preventivo ou recuperador dos solos cultivados e para tanto há cinco princípios básicos:

  1. Ter em mãos o mapeamento pedológico e geomorfológico da propriedade; 
  2. Conhecer o “tempo de recorrência climática”, fundamental no dimensionamento e adoção de estruturas conservacionistas;
  3. Saber que a fragilização do solo, provocada pela mobilização constante, aumenta progressivamente o risco de erosão;

          4 - Adotar procedimentos, padrões e indicadores de qualidade operacional, o que diminui o risco de deficiência funcional nas estruturas conservacionistas;

          5 – Entender que a capacitação técnica dos executores é preponderante.

As práticas de controle da erosão são focadas na prevenção e recuperação de processos erosivos, devendo-se observar:

  • O levantamento e planejamento conservacionista;
  • A adoção de práticas de caráter mecânico:

- Distribuição racional e adequação hidrológica de caminhos;

- Cultivo em contorno (em nível);

- Terraceamento;

- Camalhões e sulcos em pastagens;

- Canais escoadouros.

  • A instalação de práticas de caráter vegetativo:

- Plantas de cobertura;

- Pastagens / integração lavoura- pecuária

- Florestamento e reflorestamento / SAFs (Sistemas Agroflorestais);

- Culturas em faixas;

- Cordões de vegetação permanente;

- Rolagem do mato;

- Cobertura morta;

- Faixas de bordadura;

- Quebra-ventos.

  • Instalação de práticas de caráter edáfico:

- Controle do fogo;

- Calagem;

- Fosfatagem;

- Remineralização;

- Adubação verde;

- Adubação orgânica;

- Adubação química.

 

Considerações sobre agricultura regenerativa 

A agricultura regenerativa é um sistema de produção focado na revitalização dos agroecossistemas. Concentra esforços nas funcionalidades do solo. Procura desenvolver modelos de manejo regenerativos a partir da opção de produção econômica feita pelo agricultor. A estratégia de manejo regenerativo busca revitalizar as diversas funções do solo, como: armazenar, nutrir, alimentar, hidratar, proteger, abrigar, oxigenar, agregar, suprimir, entre outras mais complexas.  Alguns eixos propositivos são adotados na regeneração do solo, como aumento da biodiversidade, sequestro e armazenamento de carbono, melhoria do ciclo da água, aprimoramento dos serviços ambientais, aumento da resiliência às mudanças climáticas e fortalecimento da saúde e vitalidade do solo agrícola. 

O objetivo é melhorar e conservar a capacidade produtiva das terras, por meio de uma variedade de práticas em combinação, como, por exemplo: manutenção da máxima cobertura verde, cobertura morta, uso de rotação tripla, adição de materiais compostados e reciclagem da maior quantidade possível de resíduos agrícolas. 

Com a revitalização, cessa o processo erosivo, a saúde do solo melhora progressivamente, abrigando menos pragas e patógenos, reduzindo a dependência de insumos tecnológicos, aumentando a renda.

 

Conclusões

- A conservação do solo é a base da “arte de agricultar”.

- O agricultor que “agriculta” produz “ambientes produtivos” e não degradados.

- A tecnologia para conservar “ambientes produtivos” é acessível a qualquer agricultor.

- A produtividade verdadeira é uma relação íntima entre o ambiente, o uso correto de tecnologia e a garantia de renda.