As mulheres e a agricultura: por uma relação cada vez mais sustentável

Da Redação FEBRAPDP

As mulheres e a agricultura: por uma relação cada vez mais sustentável
Lutécia Beatriz Canalli e Priscila Silverio Sleutjes - Fotos: arquivos pessoais

Para além das questões técnicas, a agricultura, em seu exercício, requer e envolve também um amplo e rico espectro de sutilezas e sensibilidades para acontecer. A natureza é assim; com suas cores, tons e matizes próprios. Um contexto no qual o olhar, as mãos e as ideias femininas precisam estar cada vez mais presentes, deixando evidente que o conceito mais sutil da sustentabilidade também passa por esse aspecto. Para falar um pouco sobre o que elas veem muitas vezes de forma silenciosa e discreta, neste 8 de março de 2023, Dia Internacional da Mulher, pedimos a duas conselheiras da diretoria da FEBRAPDP que, do seus lugares de fala, trouxessem um pouco de como percebem e lidam com isso no seu dia a dia e na sua trajetória profissional. Então, com a palavra: Lutécia Beatriz Canalli – Eng. Agr. M.Sc. Ciência do Solo, pesquisadora na Instituto de Desenvolvimento Rural do Paraná – IAPAR-EMATER, vice-presidente da Comissão Técnico Científica e diretora do Conselho Fiscal da FEBRAPDP, e Priscila Silverio Sleutjes, Eng. Agr., presidente da Câmara temática de Agricultura Sustentável e Irrigação do Ministério da Agricultura (MAPA) e presidente da Comissão de Gestão da Água e Irrigação da FEBRAPDP.

Lutécia

Lutécia Beatriz Canalli - Foto: Arquivo Pessoal
Lutécia Beatriz Canalli - Foto: Arquivo Pessoal

O dia 08 do mês de março foi escolhido para a celebração do Dia Internacional das Mulheres, para marcar a luta de mulheres do final do século 19 e início do século 20, que saiam em passeatas nos Estados Unidos e na Europa para reivindicar melhores condições de trabalho e mais direitos.

E como estamos hoje? Será que a sociedade evolui ao ponto de tratar de forma igual mulheres e homens? A resposta é simples e cristalina, infelizmente é Não. Ainda é mais difícil para a mulher ser respeitada como igual, tanto no ambiente de trabalho quanto na sociedade. A mudança ocorreu somente na sutileza com que as abordagens injustas acontecem, mas elas ainda estão aí presentes. Precisamos provar o tempo todo que somos tão capazes como qualquer outro colega homem. Triste, mas como uma característica da mulher é a força, não me refiro aqui a força bruta, mas a força de cair e se levantar, de enfrentar situações adversas, de defender com muita garra a sua família, seus filhos e também seus ideais, vamos vencendo etapas e alcançando em nossos sonhos.

Na agricultura que sempre foi uma atividade gerida essencialmente por homens isso é ainda mais forte, mas atualmente vemos com muita alegria aumentar o número de mulheres despontando nas mais variadas áreas. Nos cursos de agronomia, nos anos 80 o número de mulheres nas turmas girava em torno de 10%, hoje as turmas tem cerca de 50% de mulheres ou até mais. E a melhor notícia é que estas mulheres estão aí no mercado de trabalho como assistentes técnicas, extensionistas, pesquisadoras, professoras, gerentes de fazendas, conduzindo suas próprias fazendas, comandando sindicatos rurais, coordenando laboratórios de pesquisa, diretoras de centros de pesquisa, universidades e outras instituições. Recebendo prêmios por suas pesquisas e feitos de toda ordem. Viva essa força tão criativa, que se reinventa a cada dificuldade e que segue firme na conquista de seu espaço. Viva as mulheres.

Além dessas conquistas, vale destacar que a sensibilidade feminina traz novos tons e matizes à relação com a agricultura. Esta sensibilidade faz com que a mulher se jogue com muito entusiasmo, criatividade e efetividade em seus projetos. A mãe natureza é também feminina, e atualmente, a sociedade se obrigou a parar para escutá-la e tirar desta lições para aprender a melhor maneira de se relacionar com a terra, com o uso do solo, com a produção agropecuária. Nesta seara também a contribuição feminina é grande, pois percebemos um engajamento forte de mulheres em projetos que buscam a sustentabilidade da agricultura. Acho que a mulher traz equilíbrio nas decisões, percebemos a importância dos ganhos econômicos e não abrimos mão dele, mas não nos cegamos para consequências nefastas de ações impensadas e imediatistas, por isso sempre buscamos o equilíbrio nas decisões e aí temos mais chances de acertar. Aqui vale destacar duas brilhantes engenheiras agrônomas que construíram as bases para a nossa agricultura sustentável, Ana Maria Primavesi e Johanna Döbereiner. Mulheres sensíveis, inteligentes e obstinadas na busca do entendimento da natureza. Gratidão a estas duas gigantes.

Sou engenheira agrônoma com muito orgulho e amo meu trabalho. Atuei muitos anos como extensionista rural e atualmente sou pesquisadora no IDR-Paraná, e sempre pautei meu trabalho na relação com a natureza. Escolhi me aprofundar no conhecimento da relação do solo com as plantas, no manejo do solo e da matéria orgânica/carbono do solo. Conheci o sistema plantio direto na propriedade do nosso saudoso Nonô Pereira, ainda como estudante de agronomia e desde então defendo este sistema conservacionista/preservacionista como a base de sustentação da agropecuária. Encontrei em meu caminho muitos mestres e gurus que fizeram aumentar este amor que tenho pela minha profissão, pela natureza e pela produção de alimentos, fibras e energia de forma sustentável. Desde 2000 estou ligada à Federação Brasileira do Sistema Plantio Direto, de 2000 a 2012 como assessora técnica e de 2012 até a presente data como membro da diretoria. Atualmente, sou vice-presidente da Comissão Técnico Científica e também conselheira fiscal. Sou grata e realizada profissionalmente, mas também tive alguns percalços que venci.

Priscila

 Priscila Silverio Sleutjes - Foto: Arquivo Pessoal 

A mulher sempre teve um papel complementar ao homem, desde o tempo das cavernas, enquanto ele saia para caçar, e neste caso aperfeiçoando cada vez mais suas habilidades em focar no seu objetivo, ser rápido, certeiro e silencioso, a mulher ficava na caverna cuidando da cria, do local e do bem estar de todos, assim desenvolveu habilidades diferentes do homem, como ser mais resiliente, agregadora, apoiadora e ter uma visão mais ampla e aguçada das possíveis ameaças.

Nos dias de hoje não é diferente, continuamos nos completando dentro dos mais variáveis desafios enfrentados. A mulher é determinada e resiliente, consegue agregar ações e pessoas com grande facilidade, e dentro do contexto de uma agricultura sustentável podemos ver que nós mulheres conseguimos inserir novos conceitos e métodos alternativos à produção e produtividade com mais facilidades, como por exemplo, introduzir e trabalhar ações ambientais e sociais juntamente com o desenvolvimento econômico da atividade agrícola, que são as bases para um processo mais sustentável.

Particularmente, como engenheira agrônoma, sempre gostei de métodos alternativos e/ou que vinham a somar no sistema de produção convencional, como por exemplo, o manejo integrado de pragas, e não apenas o controle químico, se trabalhado juntos, serão mais eficiente no médio e longo prazo; outro exemplo, os métodos conservacionistas de solo, como o Sistema Plantio Direto, que tem como um dos objetivos melhorar e manter a microbiota do solo, além de uma importante proteção contra ações físicas. O solo é a base para produção!

Quando conseguimos ter um olhar mais sustentável para o desenvolvimento da agricultura, com certeza estamos contribuindo e agregando, não que os homens não tenham, mas com certeza a mulher tem aquele ajuste fino de como e quando inserir conceitos e novas tecnologias ao processo, como desenvolver pessoas mais comprometidas, na busca de ações alternativas, assim juntamente conseguimos discutir, testar e introduzir conceitos, nem sempre tão novos, mas que se aperfeiçoam ao longo do tempo, trazendo uma visão diferente e agregadora num setor forte economicamente e ainda ocupado majoritariamente por homens.

É para finalizar, a mulher com sua essência materna, também não tem dificuldade de trabalhar em equipe, estar em cargos de liderança, resolver conflitos, botar a “mão na massa”, é determinada em tudo que ela se propõe a fazer.

Em qualquer ramo ou profissão acredito ter espaço para ambos, pois entendo que, nós mulheres, temos habilidades complementares e importante nas diversas áreas que atuamos, em alguns setores mais e em outros menos, mas precisamos estar inseridas e participando dos processos de tomada de decisão juntamente com os homens. Com certeza teremos melhores resultados se trabalharmos juntos!

Como dizem “lugar de mulher é onde ela quiser” um feliz e especial dia a todas as mulheres, em especial aquelas que se dedicam ao agronegócio e a cada dia desbravam novas frentes!!