Caberá à ciência o aumento da produção de alimentos criando gigantescos refúgios ambientais?

Por José Luiz Tejón Megido, conselheiro do Conselho Científico Agro Sustentável – CCAS

Caberá à ciência o aumento da produção de alimentos criando gigantescos refúgios ambientais?
Foto: Sebastião José de Araújo/Embrapa

O colunista do Estadão, Fernando Reinach, registra na sua coluna sobre ciência da última semana uma descoberta de cientistas chineses de um gene capaz de aumentar em 50% a produção de arroz e trigo por hectare. A pesquisa na área da engenharia genética já surpreendeu o mundo na virada dos anos 90 com sementes geneticamente modificadas resistentes a herbicidas, e outras resistentes a pragas, como a Helicoverpa armigera, e doenças.

 

O trabalho dos geneticistas ao longo das últimas décadas tem sido na busca de sementes com maior capacidade de produtividade, com maior resistência aos fatores hídricos e também numa produção de grãos e de hortaliças e frutas com maior potencial nutricional, de sabor e de facilidade no transporte.

 

Em 50 anos multiplicamos por quase 8 vezes a produção nos campos com tecnologia enquanto a área usada cresceu apenas duas vezes mais: 8 vezes 2. Jeremy Rifkin, escritor norte-americano dentre seus best sellers estão os livros “O fim dos empregos” e “O século da biotecnologia”. Numa ficção ele considerava que a produção de alimentos, fibras, e derivados dos solos, passariam a ser cada vez mais em labfarmers, do que em vastas extensões de terras.

 

No último dia 22, Reinach aponta exatamente uma nova potencial descoberta genética de um gene descoberto por cientistas chineses capaz de aumentar em 50% a produção de arroz e de trigo no mesmo hectare. De fato os geneticistas, não só os que trabalham com melhoramento clássico observando o comportamento das variedades e benefícios dos cruzamentos, mas a genética contemporânea introdutora de genes numa planta, e agora com a edição gênica, que não introduz genes novos mas os reedita naquela específica variedade vegetal, estão de fato no comando das cadeias produtivas do agronegócio.

 

Falamos aqui no Agroconsciente que agronegócio vai do gene da genética ao meme da percepção neurônica do consumidor final e do cidadão. A genética impacta decisivamente a performance dos vegetais e da proteína animal, e consequentemente exige produtores rurais muito mais avançados na sua gestão e de tudo o que envolve os modernos tratos culturais, a mecanização e a digitalização.

 

Mas nessa descoberta chinesa o gene batizado de OsDREB1C atua comandando a planta como se estivesse o tempo todo com alta voracidade de luz, fotossíntese, e também com uma busca faminta de nutrição. A pesquisa ao longo de dois anos revelou serem essas plantas de 41% a 68% mais produtivas do que as normais pois captam mais nitrogênio do solo e transformam mais e melhor a fotossíntese.

 

Sabemos nos estudos da genética que sempre que ampliamos um ângulo , uma competência no melhoramento genético de uma planta, outros fatores precisam ser avaliados, pois podem representar debilidades que precisariam ser repostas na administração dessas lavouras, como por exemplo complementos pontuais de nutrientes, para nunca nos esquecermos da lei de Liebig, agrônomo que concluiu estar nos fatores mais carentes, o que chamou da “lei dos mínimos” o maior desafio para obtermos o máximo potencial daquela planta.

 

Mas isto fica para nossos doutores e pesquisadores tratarem, vai aqui uma convocação ao CCAS, Conselho Científico do Agro Sustentável nos ajudar neste debate visionário. O Prof. Dr. Joaquim Machado, geneticista, me mandou uma mensagem falando que essa descoberta dos chineses é uma “coisa fina e sem transgênicos clássicos”.

 

Entretanto se a ciência se desenvolver a um limite de multiplicar os grãos e a produção agropecuária de forma exponencial, se dentro de cada grão de trigo, soja, feijão e arroz, da mesma forma seu aproveitamento agroindustrial for multiplicado exponencialmente, e se tudo isso ocorrer em paralelo a análises sensoriais de sabor e satisfação das nossas percepções humanas como consumidores, poderemos imaginar nos próximos 100 anos brutais revoluções com o uso de muito menos terras para a produção agroalimentar, agroenergética, e talvez muita liberação de terras para os gigantescos “refúgios ambientais”.

 

O que já foi a maior fazenda pecuária dos Estados Unidos até os anos 80 na Califórnia, Tejon Ranch, hoje é um gigantesco parque servindo, inclusive, para cenários do cinema de Hollywood, mas os motivos foram outros, não os científicos deste texto.

 

Portanto seria ficção, ou estará na ciência uma mudança revolucionária de produtividade para produção de muitos mais grãos por hectare, e muito mais proteína e energia grão a grão?

 

Dessa forma, quais serão os papéis dos novos agricultores, pecuaristas, agrônomos, veterinários, zootecnistas, geneticistas, sensorialistas, nutricionistas e profissionais de marketing agroindustriais e comerciais? Como será o “master chef” nesse futuro científico da alimentação?

 

O presente vira resultado do futuro. 2122 não está tão longe assim  e um bebê recém nascido agora terá enormes chances de estar vivo e ativo lá nesse futuro tão pertinho do presente.

 

*Artigo publicado originalmente Eldorado/Estadão