Uma tecnologia com potencial de romper paradigmas

Por Decio Luiz Gazzoni, engenheiro agrônomo, pesquisador da Embrapa Soja e membro do Conselho Científico Agro Sustentável - CCAS

Uma tecnologia com potencial de romper paradigmas
CNPEM, em Campinas, SP – Foto: Cesar Cocco

A Agência FAPESP publicou matéria da jornalista Maria Fernanda Ziegler mostrando que pesquisadores do Centro Nacional de Pesquisa em Energia e Materiais (CNPEM) desenvolveram, por meio de técnicas de engenharia genética, um fungo capaz de produzir um coquetel de enzimas que degrada biomassa. As enzimas promovem a quebra de carboidratos de alto peso molecular (como a celulose), presentes na palha e no bagaço da cana-de-açúcar, convertendo-os em mono ou dicarboidratos, que podem sofrer fermentação para produção de etanol.

A descoberta abre caminho para maior aproveitamento dos resíduos da cana-de-açúcar na fabricação de biocombustíveis, uma vez que a disponibilidade de um coquetel de enzimas de baixo custo representa um dos principais desafios para a produção do etanol de segunda geração, que é derivado do bagaço e da palha da cana-de-açúcar.

Biotecnologia

Para que o fungo pudesse servir como uma biofábrica altamente produtiva do coquetel enzimático necessário, os pesquisadores do CNPEM realizaram seis modificações genéticas em uma cepa já conhecida do Trichoderma reesei, a RUT-C30. O trabalho foi patenteado e teve artigo publicado na revista Biotechnology for Biofuels (bitly.ws/yjTr). Outro artigo foi publicado na prestigiada revista Nature (bitly.ws/yjTH.)

O fungo foi modificado para maximizar a produção das enzimas, utilizando edição genômica (CRISPR/Cas9). Foram alterados fatores de transcrição para regular a expressão de genes relacionados às enzimas. Também foram deletados genes que expressavam proteases, as quais causavam problemas na estabilidade do coquetel enzimático. Finalmente, foram adicionados genes que codificam para enzimas importantes, que eram deficientes ou ausentes no fungo.

Com a tecnologia desenvolvida no CNPEM, foram produzidos 80 gramas de enzimas por litro, que é a maior concentração já descrita em uma publicação científica, a partir de fontes de carbono de baixo custo. O valor é mais que o dobro da mais alta concentração de enzimas até então relatada na literatura científica para esse tipo de fungo, que era de 37 g/L de enzimas. Esses números não se restringem aos obtidos in vitro (laboratório), mas foram validados em uma planta-piloto, em ambiente semi-industrial, para avaliação da viabilidade econômica.